sexta-feira, 28 de novembro de 2014

del ocho




meu filho está chorando
há mais de horas
e não parou

pois seu ator predileto
foi embora
da vida, hoje, passou

e não adianta dizer
que a obra ficou
que isso, ou aquilo, é certo
não quer, mesmo
saber de qualquer pose
não quer saber
de blablablá

afinal, é tão fã
que parece até
que estava lá
nos anos enta
(e mal passou dos onze)

se foi um alguém
que ele queria ser
alguém em quem botava fé
ou seja,
é uma tristeza que não se inventa
nem quase
e, soluçante,
foi deitar, se esconder
ainda repetindo uma frase
que acho que ouviu
em algum lugar
gênio não deveria morrer

gênio?
sim, não se pode negar
que a letra "o"
é a única diferença
entre chaplin
e chapolin

e gênio que é gênio
do fim, já nasce meio
que sabendo

mas no caso de El Chavo
foi, mas sem querer

querendo



terça-feira, 16 de setembro de 2014

sobre os anjos




teve um
na verdade, uma
uma anja
(e, que gata
sempre ajeitando
a franja)

que me surgiu
de repente
quando eu estava
quase deixando
que me levassem
e, trancada a porta
da frente

ela cumpriu a missão
de me manter no mando
aí, deu uma última pisada
meio torta
daquelas de quem não quer
aprender a aterrissar
e se foi daqui

ficou só uma pena
(não das asas)
de souvenir



domingo, 3 de agosto de 2014

outoninverno




o músculo errante
pelas trevas andava
sem saber
nem ao certo
como era a face
que lá procurava

batia, forte
seguindo por versos
que pareciam ser
de Dante

e quando, enfim,
a sentiu por perto
a luz o assustou
o próximo passo lhe faltou
& foi tragado por um precipício

que o condenou
ao princício
de tudo

sentiu
que era como se já pagasse
pelos pecados futuros
e foi refazendo os caminhos
abandonando cada um
dos tantos & tantos
orgulhos

se arrastou por abril
maio, junho, que quase o levou
noite vai e dia cai
noite vai e dia cai
de repente, estava em julho

e ele se viu de novo

na própria vida
sem o estorvo da ferida
sem a sombra
que sempre o trai

só então
sonhar mereceu
e mereceu se encontrar
já em agosto
já conhecendo
cada linha do rosto dela

quase a fez chorar de rir
com uma de suas tantas
tontas
histórias velhas

logo, olhos nos olhos
ele viu além do além
do que há
era o fim das andanças
e, quando ela assentiu
pôde ler, ali mesmo
no sorriso

uma carta
da própria alma
mandando lembranças

do paraíso



quarta-feira, 30 de julho de 2014

cena x, tomada y




ela se trancava no quarto
e sonhava em ser
escritora
de livros infantis

quando me contou
deixou felizes
os pingos nos is

instante daqueles, raros
: quando tive certeza
de que ela também tinha
o ascendente
em aquário

nem vou me esforçar
nos versos seguintes

pois por menos que se rime
o livro sempre será, mesmo
bem melhor

que o filme







terça-feira, 29 de julho de 2014

quarta-feira, 30 de abril de 2014

curare




mas que dor do lado é essa
que até me deixa com pressa
de desaparecer?

que dor é essa
que nem pisca no eletro
e que nem analisando
meus pedaços de perto
os doutores conseguem ver?

é ruim até de escrever
pois o braço dói pra caramba
à cabeça na corda bamba...

tonto
& farto de codeína
& ibuprofenos
arrisquei respirar no sereno

lá fora estava bem frio
mas o corpo, fervendo, dizia:
- meu, tu tá morrendo...

então, um ventaço, num assovio
à lua de vigia
e só,
revirou as samambaias penduradas
e um gato branco, que apareceu do nada
que dó
quase morreu de susto
engoliu o miado, depois de um pulo
caiu de mal jeito
e saiu correndo de lado

ah, essa dor do lado
esse negócio
chamado peito...

(!)
se revela
o inimigo

então tiro do bolso uma navalha
(a usei para apontar os lápis)
ele gargalha
enquanto vejo de novo o gato (maluco,
com mis em miados à capela)

"tudo bem, aceito o veneno", digo,
e platão se cala

mas quase tropeço
no verso
e no bichano na minha perna

recupero a fala e solto
"beberei como se fosse suco
d'alguma uva nobre!", na verdade, berrei,
e, enfim, os vizinhos e suas luzes
foram acendendo

(seria pobre rimar com pobre, não irei,
ainda bem não precisar)

finalmente agora que sei
do que já sabia
do impossível, é claro
e que estou de novo morrendo

bem, depois que encontrar o dono do felino
(seria platão?)

eu voltarei para a caverna
voltarei para o meu eu invisível
e vou buscar nos meus sonhos de menino
algum raro sorriso pra me apegar

não, não dá!
apenas o dela
é o que há
é o que há
é o que há

mas que raio de dor é essa?
pois já acho mesmo que vou morrer
e ela não vai
passar